Cerca de 1.500 brasileiros já se ofereceram para se infectar com coronavírus em possíveis testes de vacinas
Quando Josh Morrison decidiu recrutar voluntários
dispostos a se infectar com Covid-19 não imaginava que a procura seria tão
alta, muito menos de pessoas nascidas no Brasil.
Em pouco menos de um mês, 6.000 voluntários, 1.500 deles
brasileiros, se inscreveram para participar dos chamados desafios humanos, nos
quais indivíduos saudáveis são infectados com uma determinada doença para
receber uma vacina ou um tratamento ainda não aprovado.
Formado em direito na Universidade Harvard, nos EUA, o
americano de 34 anos fundou a plataforma 1 Day Sooner em 30 de março, depois de
ler artigo na revista científica The Journal of Infectious Diseases sobre
experimentos que poderiam acelerar a produção de vacinas contra a Covid-19.
Um farmacêutico dá a Jennifer Haller, à esquerda, a
primeira dose de uma potencial vacina para covid-19. "Moro em Nova York e
a situação aqui é bem ruim" -nesta terça (28), eram mais de 292 mil casos
e 17 mil mortes no estado. "A ideia de poder acelerar esse processo de vacina
foi muito significativa para mim", afirmou Morrison à Folha de S.Paulo.
O objetivo do americano é criar um grupo de pessoas
confiantes e aptas a participar, caso esses estudos aconteçam nos próximos
meses.
A inscrição online na plataforma fundada por Morrison é
apenas a primeira demonstração de interesse do voluntário. Nesta semana, ele
explica, serão enviados estudos acadêmicos para que as pessoas se informem
sobre o tema e os riscos dos possíveis testes, além de questionários para que a
equipe conheça os perfis.
Segundo Morrison, os inscritos são de 52 países, a
maioria é jovem, de 20 a 35 anos, com ensino superior completo, mas há casos de
pessoas com 50 e até 80 anos.
No entanto especialistas afirmam que o desafio humano
deve ser feito apenas com pessoas jovens e saudáveis e, mesmo assim, há riscos.
"As pessoas querem fazer alguma coisa que ajude
nessa crise terrível, elas se sentem mais empoderadas com essa possibilidade e
essa é a motivação mais comum de quem se voluntaria", diz o americano.
Considerados situação-limite, os estudos de desafios
humanos começaram a ser cogitados por cientistas diante da busca por soluções
contra a Covid-19, que já infectou mais de 3 milhões de pessoas no mundo todo e
matou mais de 213 mil.
O processo de desenvolvimento de uma vacina normalmente
leva muito tempo, com diversas fases que incluem testes in vitro e em animais
antes de experimentos em humanos.
Há cientistas que preveem entre 12 e 18 meses para a
produção de uma vacina eficaz, mas há especialistas que afirmam que mesmo esse
prazo pode ser considerado recorde.
No artigo do Journal of Infectious Diseases que chamou a
atençao de Morrison, pesquisadores afirmam que os desafios humanos podem
acelerar a aprovação de uma vacina contra o novo coronavírus, encurtando a
terceira e última fase do processo, geralmente a mais demorada.
Nessa etapa, milhares ou centenas de milhares de
voluntários são recrutados para o teste. Parte deles recebe a vacina e parte,
um placebo. Essas pessoas ficam expostas à infecção natural e, em até dois
anos, os cientistas verificam a eficácia da vacina.
No desafio humano, são infectadas menos pessoas, em
ambiente controlado, acelerando esses testes.
Os riscos dos desafios humanos são mais baixos quando se
trata de doenças conhecidas, o que não é o caso da Covid-19.
No site do 1 Day Sooner, os organizadores afirmam que o
desafio humano expõe deliberadamente os participantes à infecção com o objetivo
de estudar e testar vacinas ou tratamentos e que esse tipo de experiência foi
usada durante epidemias de influenza, malária, febre tifoide, dengue e cólera.
Eles ponderam os "riscos incertos" no caso da
nova pandemia e dizem que os voluntários ficariam isolados em uma estrutura
hospitalar e seriam monitorados para não transmitir a doença para o resto da
população, com possibilidade de atendimento médico rápido, caso necessário.
Em março, a OMS (Organização Mundial da Saúde) anunciou
que 3,4% dos casos confirmados de Covid-19 resultam em morte, mas essa taxa
pode ser maior, já que vários países não tem alta capacidade de testagem, o que
gera subnotificação de diagnósticos.
Ainda de acordo com a organização, há 76 vacinas contra a
Covid-19 sendo desenvolvidas atualmente, 71 em estágio pré-clínico e 5 em fase
clínica.
Fonte: DP
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