A Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou hoje
(11) o coronavírus como uma pandemia, num reconhecimento de que a mera
estratégia de conter a proliferação da doença já não seria suficiente. A
classificação significa que uma transmissão recorrente está ocorrendo em
diferentes partes do mundo e de forma simultânea.
Na prática, ao anunciar a pandemia, a agência de saúde
indica que governos devem trabalhar não mais para apenas conter um caso. Mas
atuar também para atender uma parcela da população mais ampla e vulnerável.
Estratégias direcionadas apenas para identificar casos e isolar pessoas
precisam ser trocadas por um plano sanitário que evite mortes e que atua para
toda a população.
A mudança no status não significa que a taxa de
letalidade tenha sido incrementada e nem que as orientações da agência serão
modificadas. Mas é um chamado da OMS apela para que governos adotem medidas
mais duras e agressivas.
Segundo a entidade, nas últimas duas semanas, o número de
casos fora da China cresceu 13 vezes e o número de países afetados triplicou.
Em apenas uma semana, o número de países afetados passou de 45 para 114. O
Brasil tem ao menos 35 casos confirmados.
Até o mês de fevereiro, a entidade insistia que a
proliferação em grande escala apenas estava sendo registrada em cidades
chinesas, com o casos fora do país asiático ainda podendo ser contidos. Isso,
em termos técnicos, não representaria uma pandemia e, portanto, a entidade
resistia em passar para um nível superior de alerta.
Mas, nos últimos dias, a agência com sede em Genebra já
vinha alertando que a capacidade de sistemas de saúde em frear o surto estava
se esgotando. O risco global foi elevado na semana passada para "muito
elevado" e preparações para uma nova fase começaram a ser feitas. Ainda
assim, a entidade passou a ser questionada por seu comportamento.
Enquanto Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, fazia
o anúncio na sala de operações da entidade, telões pelas paredes mostravam a
dimensão do surto pelo mundo. 118 mil casos confirmados e mais de 4,2 mil
mortes.
Desse total, mais de 80 mil casos estão na China. Mas a
alta no número de casos na Itália, Irã e Coreia do Sul e a expansão para novas
regiões transformaram a maneira pela qual a OMS reage à situação.
A agência prevê que o mundo verá um aumento no número de
casos nos próximos dias. Mas Tedros insistiu que essa é a primeira pandemia que
pode ser contida.
Falta de Ação
De fato, um dos objetivos da OMS com a declaração é a de
conscientizar governos a agir, enquanto a entidade insiste que muitos continuam
sem entender a dimensão do problema.
Tedros, pedindo calma e solidariedade internacional,
deixou claro que o uso da palavra "pandemia" deve ser usada com
"cuidado" e ciente do que isso pode representar. Mas alertou que
estava preocupado com a negligência de parte da comunidade internacional.
Para o diretor, existe ainda um "nível alarmante de
falta de ação" por parte de alguns governos. A OMS se diz preocupada com a
falta de medidas para detectar casos e critérios para aceitar pacientes.
A entidade também alerta que existem governos que
"não estão comunicando bem com suas populações". No Brasil, o
presidente Jair Bolsonaro chamou a situação de "pequena crise" e
elementos de "mais fantasia".
"Uma epidemia é um teste de confiança entre
populações e governos e teste de resistência", declarou Michael Ryan,
diretor de operação da OMS.
O risco de uma pandemia
A decisão, segundo fontes na OMS, exigiu um amplo debate
interno e com consultores, justamente diante do risco que a nova classificação
poderia gerar. Um dos medos era de que, além do impacto econômico, o uso do
termo poderia gerar algum pânico. Outro risco era de que, ao classificar algo
como pandemia, governos poderiam abandonar esforços de contenção.
Ao terminar coletiva de imprensa, representantes da OMS
explicaram aos jornalistas de todo o mundo que a agência não tinha o poder de
"declarar" uma pandemia. Mas apenas constatar e classificar uma
situação como pandemia. Ainda que a forma de apresentar o caso signifique
apenas uma questão técnica, ela tem um aspecto legal para a agência de Saúde.
"Falar que é pandemia não significa que devemos sair
da estratégia de contenção para mitigação. Não estamos falando isso. Mas sim
uma estratégia completa e que contenção deve ser o pilar central",
insistiu Tedros.
A preocupação principal da OMS é de que, ao declarar a
pandemia, governos abandonem o esforço de contenção. "90% dos 118 mil
casos estão em apenas quatro países", disse. "Seria um erro abandonar
a contenção. Neste momento, 81 países ainda não têm casos e devem fazer de tudo
para impedir que o vírus chegue. 57 países têm menos de dez casos. Eles podem cortar.
Esse é o primeiro coronavírus a ser uma pandemia. Mas é o primeiro que poderá
ser controlado", indicou.
Michael Ryan deixou claro que o momento é de ação.
"Esse é um alerta para todos os governos do planeta", disse.
"Acordem. O vírus pode estar a caminho", insistiu.
Segundo ele, cada governo agora deve decidir de fechar
escolas ou não e que tipo de decisões tomar. Mas o especialista apela:
"não usem essa declaração para justificar um abandono da estratégia de
contenção. Não é uma desculpa para desistir. Ainda podemos parar isso",
insistiu.
Ryan acredita que governos precisam rever suas
estratégias a partir de agora e estabelecer suas prioridades. "Nada disso
vai mudar o que fazemos. Apenas pedimos medidas mais agressivas e duras",
insistiu.
Uma das questões centrais é o impacto de um número
elevado de casos sobre sistemas de saúde já frágeis. "Governos precisam
avaliar se vão aceitar que a doença vai se proliferar e apenas focar em reduzir
fatalidades", disse.
Um exemplo usado por Ryan é o da Itália, onde 900 pessoas
em UTI, colocando serviços em ponto de ruptura. "Esse não é mais uma
questão apenas para o ministério da Saúde. Mas para sociedades inteiras",
completou.
do UOL
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