Na sexta-feira, o porta-voz do Planalto fez questão de
relatar à imprensa que Jair Bolsonaro havia
conversado por telefone com Hamilton
Mourão. O governo preferiu ser vago. Informou apenas que os dois discutiram
“alguns assuntos” e trocaram impressões sobre uma nebulosa “integração de ações
governamentais e de planejamentos futuros”.
Não se sabe se a ligação durou mais do que os 40 segundos
gastos pelo assessor para dar a notícia. Ninguém contou, também, se a dupla teve
tempo de trocar algumas palavras sobre o inesperado encontro
de Mourão com dirigentes da CUT.
Ao abrir o Planalto para um grupo historicamente alinhado
ao PT, o vice reforçou a sensatez com que exerce o cargo, mas também cometeu um
ato quase transgressor para demarcar mais uma diferença em relação a Bolsonaro.
A distância política entre os dois é cada vez maior.
O presidente nunca escondeu seu desapreço pelas centrais
trabalhistas. Em novembro, após vencer a eleição, ele ironizou essas
corporações: “A vida de sindicalista é muito boa. É ficar lá, só engordando”.
Meses antes, o filho Eduardo fizera um discurso na Câmara em que chamava
integrantes da CUT de “vagabundos”.
Mourão, ao contrário, disse aos sindicalistas que
gostaria de liderar a interlocução do governo com movimentos sociais, segundo o
relato de um dos participantes do encontro.
A última semana delineou uma ruptura entre o núcleo
bolsonarista e o vice. Depois que a revista Época noticiou que Mourão havia
debochado dos livros de Olavo
de Carvalho, o ideólogo chamou o general de “charlatão desprezível”. No dia
seguinte, os filhos Carlos e Eduardo mostraram de que lado estão: apoiaram
Olavo e disseram que ele foi responsável pela vitória de Bolsonaro.
Quando João Figueiredo se internou nos EUA para uma
cirurgia em 1981, ele recebeu 72 ligações durante 16 dias. Nenhuma delas partiu
do vice Aureliano Chaves, com quem o presidente mantinha uma relação de
desconfiança. Bolsonaro e Mourão ao menos ainda se falam ao telefone.
Bruno Boghossian – Folha de S.Paulo