Do Blog Motiva Gente
Três em cada quatro brasileiros poderão ser incluídos no
decreto que o governo Jair Bolsonaro está preparando para facilitar a posse de
armas de fogo. O presidente estuda associar a liberação simplificada para quem
mora em cidades onde a taxa de homicídios por 100 mil habitantes é maior que
10. Levantamento do Estado com base em dados do Ministério da Saúde mostra que,
nesse caso, a medida atingiria 3.485 das 5.570 cidades, ou 62% dos municípios
do país, onde vivem 159,8 milhões de pessoas (76% da população brasileira). Em
Pernambuco, por exemplo, 95,7% dos 185 municípios poderão ter acesso facilitado
a armas.
A Polícia Federal, além de documentos e exames
psicológicos e de capacidade técnica, exige hoje que o cidadão apresente
justificativa de “efetiva necessidade” para a posse de arma - o que permite ter
o equipamento dentro de casa ou de estabelecimento comercial. O decreto de
Bolsonaro deverá dizer o que objetivamente seria uma justificativa aceitável.
Uma das ideias em estudo, segundo revelou o presidente, seria afrouxar essa
“efetiva necessidade” nessas cidades violentas. Assim, o cidadão que requerer
na PF a arma nesses lugares, em tese, veria o processo andar mais rápido.
A maior parte dos estados do Norte e Nordeste, por
exemplo, teria uma grande parcela das suas cidades serem afetadas. A exemplo de
Pernambuco, no Acre (95,4%), Alagoas (92%), Pará (90%), Sergipe (89%), Ceará
(88,5%) e Amapá (87,5%), o porcentual é elevado. As cidades que poderão ter as
regras alteradas, além de compreender parcela significativa da população,
concentram 94% dos homicídios. Na outra ponta, São Paulo (36,1%), Piauí (39,2%)
e Santa Catarina (40%) têm a menor proporção de cidades violentas. A cidade de
São Paulo seria a única capital não incluída na medida.
O Estado analisou dados preliminares referentes a 2017
registrados pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério
da Saúde. Esse registro engloba várias causas de mortes intencionais, como arma
de fogo, arma branca (faca) e agressões corpo a corpo. O dado, porém, não
inclui mortes causadas em ações policiais, que em alguns estados, como São
Paulo e Rio, podem ser significativas ante o total de homicídios.
Como o Ministério da Justiça não produz dado atualizado e
completo sobre violência, a expectativa é de que Bolsonaro se baseie nos
números do Ministério da Saúde. Com eles, o Instituto Nacional de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) produz o Atlas da violência, que também poderá ser
usado. Ao Estado, o coordenador do Atlas, o economista Daniel Cerqueira,
criticou ontem a eventual escolha do método. Segundo ele, pode haver
distorções. “O governo tem de explicar a escolha desse parâmetro (taxa acima de
10 por 100 mil). O que vai ser dito para a cidade que tem nove homicídios por
100 mil? E as cidades pequenas que tiveram dois assassinatos e, mesmo assim,
têm taxa acima de 10?”, disse. “Além disso, pode haver distorções, já que há
quantidade considerável de mortes por causas indeterminadas.”
O pesquisador critica também o aspecto geral da medida.
“Se o Estado está interessado em reduzir a violência, deveria olhar para as
evidências científicas e não passar por cima dos estudos. Armar a população vai
jogar mais lenha na fogueira dos homicídios e agravar a miséria da segurança
pública atual.” A medida, defende Bolsonaro, garante o direito da população em
ter armas para legítima defesa. Poderá, segundo o presidente, fazer frente à
violência nas cidades. Fonte: Wildes de Brito