Há um ano, Alexandre Farias, de 40 anos, voltava para
casa após apresentar o ABTV 2ª Edição quando foi atingido
na cabeça por uma bala perdida em Caruaru, no Agreste de Pernambuco. O
jornalista, que está se recuperando das sequelas do incidente no Recife, contou
ao G1que, apesar de tudo, não tem raiva da vida. "Eu perdoei quem fez
isso comigo", disse.
Sobre perdoar o criminoso que efetuou o disparo de arma
de fogo, o jornalista é firme ao dizer que o "perdão traz paz para o
coração" e que "é importante buscarmos a paz de espírito".
"Eu não tenho revolta da vida. Eu não tenho raiva de ninguém. [O que
aconteceu comigo] foi um fato. Eu passava no local. Foi um incidente. [O tiro]
não foi direcionado para mim. Talvez a pessoa [que atirou] nem saiba o que
fez", destacou.
Alexandre atualmente mora em um apartamento da família,
na capital pernambucana. O imóvel fica próximo das casas dos parentes, dos
hospitais e clínicas. No local, ele contou que os últimos meses têm sido de
muita reflexão.
"Eu pude ver com quem e como eu posso contar, seja
família ou amigos. Não foi um período fácil, mas eu estou vencendo. Entendo que
é um processo lento, mas eu estou otimista. Eu já vejo resultados positivos na
minha recuperação", ressaltou o jornalista.
"Nenhum médico me disse que eu não vou andar mais.
Nenhum médico me disse que eu vou deixar de falar. Nenhum médico me disse que eu
deixaria o ABTV. Ninguém. Eu estou super confiante", Alexandre Farias.
Ao G1, ele detalhou o que lembra do dia em que foi
atingido pela bala. "[Na hora do tiro] eu apaguei. Eu só lembro que saí da
TV, peguei o carro e fui para casa. Depois disso, só lembro do barulho dos
aparelhos no hospital. Passei um período desacordado e outro acordado".
Alexandre Farias voltou a tomar 100% da consciência ao
acordar após
a realização da cranioplastia. "Acordei com uma torcida na minha
frente. Eram os médicos, um batalhão que trabalhou por mim. Quando eles
disseram: 'Alexandre?'. Eu respondi: 'Oi!'. Depois eles deram um grito. Parecia
que eu tinha feito um gol. E foi um gol, mas de consciência. Eles tinham visto
que a cirurgia tinha dado certo, que a prótese tinha funcionado",
recordou.
O jornalista disse que está consciente e não esqueceu de
ninguém. Ele se lembra quem são os cinegrafistas, produtores e demais amigos da TV
Asa Branca, sua segunda casa e família, como ele gosta de dizer. "Sei onde
fica a TV, no [bairro] Pinheirópolis, sei que na frente tem a rodoviária, sei
onde moro, da minha infância, que vivi e cresci na cidade de Escada e que
depois vim para o Recife, sei que sou jornalista e que estou à frente do ABTV
2ª Edição", afirmou.
Alexandre explicou que tem passado por muitas etapas e
que todas elas têm sido muito dolorosas. No entanto, ele está visando o bom
resultado do tratamento. O jornalista está sendo acompanhado por uma
fisioterapeuta, que faz sessões diárias de uma hora de duração, um psicólogo,
fonoaudiólogo, nutricionista e clínico geral.
"O pensamento positivo das pessoas e as orações se
transformaram em coisas boas, em energias boas para mim. Por isso que eu estou
aqui. Foi isso que me impulsionou a querer vencer", Alexandre Farias.
Aos poucos, Alexandre tem ligado para os amigos, que são
muitos, e para as pessoas que o ajudaram no momento em que ele foi ferido pelo
disparo. Para ele, é importante agradecer a todos. "Eu estou vivo e sou um
milagre de Deus. Sei que Deus fez um milagre na minha vida. Eu tento agradecer
a todas as pessoas. Aproveito para falar aqui: Obrigado, gente. Obrigado
mesmo".
No dia em que Alexandre recebeu, pela primeira vez após a
alta, uma equipe de reportagem para falar sobre o incidente, ele estava
acompanhado do irmão, José Santos Júnior, do sobrinho, Igor, e da amiga, Marcia
Queiroz.
Assim como o período em que esteve no hospital, o jornalista não fica
sozinho no apartamento, estando sempre com duas ou mais pessoas.
"Como é bom ter amigos, como é bom ter família e
como é bom ter um irmão. Meu irmão é meu braço direito", ressaltou. Ao
irmão, ao sobrinho e à amiga, ele disse: "Por vocês eu estou ficando de
pé, por vocês eu vou viver e voltar a ser o Alexandre andando, caminhando e
dirigindo", deixando todos emocionados.
"Na hora em que eu estou sentindo muitas dores, eu
lembro das orações. Eu lembro da torcida, eu lembro dos meus telespectadores.
Isso me motiva a ficar de pé de novo. Aos pouquinhos, devagar, mas
recomeçando", Alexandre Farias.
Mostrando que continua com o senso de humor
característico dele, Alexandre brincou ao dizer que agora está "comendo
bem como um cavalo" e que sente saudades de comer crustáceos - único
alimento ainda proibido pelos médicos.
O jornalista recebe visita dos amigos e familiares quase
que diariamente, e garante que gosta muito de ver as pessoas que, de alguma
forma, participaram de algum momento da vida dele.
Sobre a mensagem que fica após enfrentar tantas
dificuldades nos últimos 365 dias, Alexandre é direto: "Nossa vida é como
uma vela, basta um sopro para acabar. Nós somos frágeis, não sabemos o dia de
amanhã. Por isso, aproveitem o hoje intensamente. Liberdade com
responsabilidade, como dizia minha mãe. Levem de lição a minha história e
vivam. Liberdade com responsabilidade. Não esqueçam disso".
Resumo da trajetória de Alexandre no último ano:
No dia 16 de setembro de 2017, Alexandre voltava para
casa quando foi atingido por uma bala perdida, no bairro do Alto do Moura.
Todos os criminosos que participaram do tiroteio que
atingiu o jornalista foram presos entre os dias 18 e 20 de setembro.
Alexandre Farias apresentou redução no edema cerebral 11
dias após o incidente.
No dia 28 de setembro, o jornalista foi transferido do
Hospital Unimed, em Caruaru, para o Hospital Esperança, no Recife.
No início do mês de outubro ele começou a responder a
estímulos, mas continuava respirando com a ajuda de aparelhos.
Ao G1, dois meses após Alexandre ter sido atingido
pela bala perdida, a médica intensivista e chefe da UTI geral do Hospital
Esperança, Mariza da Fonte, informou que ele estava em "processo de
reabilitação".
No dia 7 de dezembro, o jornalista recebeu alta da UTI e
foi para o quarto.
Em março deste ano, Alexandre foi submetido a uma
cirurgia para colocação da prótese craniana. O procedimento foi considerado um
sucesso pelos médicos.
No mesmo mês da cranioplastia ele voltou a falar.
O jornalista recebeu alta do hospital após 8 meses internado,
em 25 de maio de 2018.
O que diz a fisioterapeuta?
A fisioterapeuta Valesck de Fátima acompanha Alexandre há
três meses. Para ela, neste período, o jornalista apresentou melhoras
significativas. "Já conseguimos devolver mobilidade aos pés, aos tornozelos,
ao quadril e às mãos, principalmente do lado esquerdo", explicou.
Ao G1, Valesck revelou que Alexandre "está
evoluindo muito bem, dentro do esperado para o quadro do acidente que aconteceu
com ele". Ela ainda contou que o jornalista sofreu encurtamentos
musculares e algumas aderências, mas que isso já está sendo trabalhado para que
ele volte a ter mobilidade e independência.
De acordo com a fisioterapeuta, o acompanhamento é
importante para que o jornalista tenha maior qualidade de vida e menos dores -
estas são causadas devido ao tempo em que ele passou de cama.
"Já começamos a colocar ele em pé e ensaiar alguns
passos, mas tudo muito rudimentar porque ele está em processo de reabilitação.
Ele tem condições de voltar a andar sozinho", Valesck de Fátima.
Alexandre Farias poderia ter ficado com mais sequelas do
que as que ele apresenta. Porém, as consequências do tiro são esperadas dentro
do quadro em que ele se encontra, conforme informou a fisioterapeuta.
"Força de vontade ele tem de sobra. É o meu paciente
mais alto astral. Ele colocou na cabeça que ele pode, que consegue. E a gente
está aqui pra isso", disse Valesck.
Ajuda da família
Para o irmão de Alexandre Farias, o último ano também não
foi fácil. É que José Santos Júnior esteve junto do jornalista em todos os
momentos, desde a primeira cirurgia, em Caruaru, até este processo de
recuperação.
Em entrevista ao G1, ele recordou como foi receber a
notícia de que o irmão mais novo tinha sido vítima de uma bala perdida.
"Uma notícia dessas, num sábado à noite, para a família receber, não é uma
coisa fácil. A gente não deseja para ninguém. Quando nós chegamos em Caruaru,
no primeiro momento do acontecido, tudo era uma coisa muito nova, inesperada. A
cada notícia, a cada boletim, foi que tivemos noção da gravidade",
lembrou.
Assim que Alexandre foi submetido à primeira cirurgia,
ainda no Hospital Unimed, o médico não escondeu da família qual era o estado de
saúde do jornalista. "Ele [o médico] foi bem claro. Disse que a situação
era bem delicada e que tudo poderia acontecer naquele momento".
"Graças a Deus, tivemos muita força, muito apoio.
Cada momento que passava, a gente tinha mais esperança", José Santos
Júnior.
Quem contou para o jornalista sobre o acidente foi
Júnior, ainda no Hospital Esperança. Para o irmão de Alexandre, a reação dele
ao saber que tinha sido atingido por um tiro foi fundamental para ajudá-lo na recuperação.
"Quando eu contei, de imediato, ele falou: 'Não tenho raiva de quem fez
isso comigo, porque não era para mim'".
Passada a gravidade do estado de saúde do jornalista, o
irmão dele destacou que agora o momento é de felicidade. "A gente só tem
que agradecer. Primeiramente a Deus, depois à ciência, por Alexandre chegar
nesse ponto que chegou, e depois ao círculo de amizade dele e aos familiares.
Isso foi muito importante na recuperação dele", falou José Júnior.
O irmão de Alexandre ainda complementou, falando que
desde setembro de 2017 "teve muita dedicação por parte da família, dos
amigos e de outras pessoas que se dispuseram a ajudar".
"Estamos muito confiantes que daqui para frente será
ainda melhor. A cada dia é uma evolução. A gente sempre comemora muito",
José Santos Júnior.
Sobre as visitas que Alexandre recebe, José Júnior
afirmou que percebe até uma mudança no comportamento das pessoas quando vão
embora. "Quem vem visitar ele sai melhor do que chegou, mais leve, pela
forma que elas [as pessoas] encontram ele".
Saudades da TV e dos palcos
Com 40 anos de idade, Alexandre Farias tem duas paixões
profissionais: o jornalismo e o teatro. O jornalista passou por rádios e
emissoras de TV de Pernambuco e da Paraíba antes de integrar a equipe da TV
Asa Branca, em abril de 2015.
Na emissora de Caruaru ele exerceu a função de editor e
apresentador do ABTV 2ª Edição por mais de dois anos. Há um ano
afastado da TV, ele destacou: "Existe toda uma equipe trabalhando para me
deixar em pé de novo, preparado para o ABTV e para tocar a vida. Eu tenho
saudade de estar na TV, mas tudo, daqui uns dias, vai se normalizar".
À frente do telejornal de maior audiência do estado de
Pernambuco, de acordo com o Ibope, Alexandre cativou o público e foi
premiado como o melhor apresentador da região Nordeste, pelo "Melhores do
Telejornalismo", com 22% dos votos.
Quanto ao teatro, o jornalista conheceu esta arte ainda
na adolescência. De 2006 a 2017 ele fez parte
do elenco da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, espetáculo encenado no maior
teatro ao ar livre do mundo. No local, ele deu vida ao apóstolo Bartolomeu
e ao mau ladrão, que é crucificado junto de Cristo. Alexandre também atuava em
outras cenas da peça cinquentenária.
A possibilidade de voltar às televisões dos pernambucanos
e aos palcos tem sido um incentivo, que ajuda na recuperação dele. "Eu
quero muito voltar [...] e fazer o que eu mais gosto: que é o compromisso com o
jornalismo com credibilidade. E também para voltar aos palcos de teatro, para
as casas dos meus amigos, caminhar... Eu estou com saudade de andar, de
dirigir... Mas vou voltar, porque Deus é mais", garantiu.
Último telejornal que apresentou em 2017
O último telejornal que Alexandre apresentou em 2017 foi
em um sábado, no dia 16 de setembro. Naquele dia, o jornalista falou sobre o
balanço da violência referente ao mês de agosto, que havia sido divulgado pela
Secretaria de Defesa Social de Pernambuco (SDS-PE).
No ano passado, o oitavo mês foi considerado o mais
violento dos últimos sete anos. Na ocasião, Alexandre Farias também falou dos
dados da violência na primeira metade de setembro.
Ele não se lembrava sobre o que tinha falado naquele
telejornal e ficou surpreso ao saber que tinha divulgado os dados de violência.
"E horas depois eu fui vítima de uma bala perdida.
Por isso que eu digo que ninguém sabe do dia de amanhã, por isso o hoje é o
mais importante. E Deus é a solução para tudo. Fé, força, coragem, otimismo
sempre", afirmou.
Fonte: G1 Caruaru