Reinaldo Azevedo – Folha de S.Paulo
Lula, o presidiário, chega
ao patamar de 40% dos votos no primeiro turno (39%) e 20% das menções
espontâneas. Venceria seus potenciais adversários no segundo turno com mais de
50% dos votos, marca também inédita depois que o PT foi tragado por sua própria
história e pelas escolhas que fez. É o que aponta a mais recente pesquisa
Datafolha. Em
segundo lugar, está Jair Bolsonaro, com 19%. Ele não sabe a diferença
entre a dívida pública e uma pistola.
Setores do Ministério Público Federal e do Judiciário
resolveram proteger o eleitor de si mesmo e tirar Lula da disputa. Não só isso:
atuaram para prendê-lo ao arrepio do que estabelece o Inciso LVII do Artigo 5º
da Constituição.
A sentença de Sergio Moro que
o condenou entrará para os tais anais, passados o aluvião de estupidez
militante e a covardia da OAB, como exemplo do que um juiz não deve fazer.
Quanto aos 50 tons de preto do uniforme de combatente, bem, deixo essa questão
para os especialistas em bom gosto. Atenho-me ao bom senso. Já temos o
resultado prático de toda essa dedicação.
Os “Jovens Turcos” de Banânia (pesquisem a respeito do
que se tornou uma metáfora e um conceito) resolveram, já desde a aprovação da
Lei da Ficha Limpa —com o apoio do PT e a sanção de Lula, note-se—, que o povo
não era competente para fazer suas próprias escolhas.
Com um Lula que ainda nem réu era, falando pelos
cotovelos, o PT foi esmagado nas urnas há menos de dois anos. Sem a
interferência dos homens de preto, é provável que o partido estivesse
experimentando agora o mesmo vexame.
Depois de todos os atalhos e licenças jurídicas para
encarcerar o ex-presidente, vejam o que se tem: ele só não será eleito porque
os togados do salário sem teto resolveram cassar a vontade dos quase
analfabetos de tão pobres e pobres porque quase analfabetos —vai aqui uma
deferência a Caetano Veloso, possível leitor...
Se combater o autoritarismo do PT fosse competência
moral, eu seria Catão; se intelectual, eu seria Schopenhauer. Não sou, por
óbvio, nem uma coisa nem outra. Apego-me, muito estoicamente, a princípios de um
Estado liberal, cujo eixo são os direitos individuais e o respeito ao que está
democraticamente pactuado.
Não reconheço a nenhum ente a licença da tutela da vida
pública, além da Constituição. Mais do que a convicção, a história e a
experiência vivida me dizem que a violação do Estado de Direito com o propósito
de fazer justiça é ineficaz porque não resolve o problema a que se propunha e é
contraproducente porque gera efeitos contrários à pretensão voluntariosa.
Não será diferente desta vez. Contra o que determina o
establishment dos homens de negro, a maioria que se dispõe a votar quer como
presidente um preso ainda provisório. Qualquer que seja o resultado, a pantera
da instabilidade nos espreita.
Uma palestra de Deltan Dallagnol custa R$ 35 mil. Carlos Thompson
Flores, presidente do TRF-4, dá palestra no Clube Militar, cujo presidente é
Hamilton Mourão, vice na chapa de Bolsonaro. Cármen Lúcia canta, afinada: “Não
deixem o samba morrer/ o morro foi feito de samba...” E o sangue escorre do
morro que não samba mais.
Existem a Constituição e a “Sharia de Curitiba e
Adjacências”. Esta tem prevalecido sobre aquela. E, lá da cadeia, Lula decidiu
demonstrar que existe uma lei ainda mais antiga: não ofereça a seu adversário a
vantagem moral da vítima.
O PT já venceu a disputa de 2018, qualquer que seja o
resultado, como
antecipei nesta coluna no dia 17 de fevereiro do ano passado: “Se todos são
mesmo iguais, então Lula é melhor.” Bingo!