A BANALIDADE DO MAL
O mal não é algo em si
mesmo, uma situação com vida própria, é, pois, a ausência do bem. A cada vez
que o bem se afasta o mal se aproxima, se agiganta, toma conta. A constante
presença do mal (na ausência do bem) o faz corriqueiro, banal. Se algo é banal,
é comum, é entediante e sem originalidade.
Mataram um, agora, na COHAB:
- Era “alma sebosa”?
Mataram um cara no Santo Antônio;
- De novo?
Fizeram um “arrastão” no centro:
- Mais um...
Lembro-me, quando criança lá no Bom Conselho, que houve um
homicídio em um bar próximo ao cemitério – um homem matou outro a facadas, era
começo de noite, e uma atmosfera pesada tomou conta da rua, aquilo parecia um
pesadelo, era sinistro. Eu, como criança, não podia olhar, mas podia sentir nas
pessoas que viram e comentavam, o medo, a indignação e o horror com aquela
cena. Era uma vida interrompida, não importava quem era a vítima. As pessoas se
recolheram das calçadas, o medo se fez presente, tudo ficou muito quieto e
assombroso, o bar passou uma semana fechado, claro, ninguém era capaz de não se
importar com o morto, com a morte, com o crime, com o mal.
Hoje não. Nada disso existe, já nos acostumamos, nossas
crianças já não se espantam com o mal, com as mortes. Já são quase 50 mortes
violentas nessa cidade, mais de 500 assaltos, 10 “arrastões” em menos de um
ano. Não dá tempo para indignação, para o medo, para revolta ou simplesmente se
importar com a violência, com o mal. E por estar tão perto tornou-se comum a
nós, e esse é o grande perigo do mal, quando ele se torna banal, quando se
justifica em si mesmo.
Mas o pior, se é que tem algo de pior no mal, é que não
sabemos combatê-lo, enfrentá-lo. Pelo contrário, nos recolhemos das calçadas,
das ruas. A câmara de vereadores da cidade deu o exemplo, com medo de seus
nobres membros serem assaltados, trocou o horário das sessões, assim eles
estarão seguros, os bandidos não irão lá, nem o povo. A delegacia segue no
mesmo caminho, tranca suas portas, de cadeado, às 18h. O fórum, promotor da
justiça, que não é besta, está trocando as janelas por grades, lá dentro todos
ficaram “seguros”.
A polícia, coitada, faz sua parte; sucateada, mal
remunerada, quase desarmada, recomenda; não reaja ao assalto, não ande com
celulares, com joias, com dinheiro, nem fique nas calçadas, nem na rua até
tarde, não ande sozinho, nem no escuro. O bom mesmo seria irmos para casa mais
cedo, como fazem os vereadores, trancarmos nossas portas de cadeado, como a
delegacia, e, por fim, colocar grades em nossas janelas, tal qual faz o fórum.
Como tolos, suplicamos: ô, e agora, quem poderá nos
defender? ... E nada, não aprece ninguém, nem o Chapolin Colorado.
O mal não é algo em si mesmo, é sempre a ausência do bem, e
enquanto o bem se afasta lentamente, o mal de aproxima depressa demais, e vai
se tornando comum, banal.
Texto: Dr. Evandro Mauro.
(Advogado e bacharelando em psicologia).