Escutar uma música sem se preocupar com a pilha do rádio
é um dos sonhos de Maria Francisca. A camponesa de 52 anos mora com a família
em um sítio no município de São Lourenço da Mata, situado na Região
Metropolitana do Recife (RMR), desde que nasceu. Lá, em uma casa cercada pela
plantação de cana-de-açúcar da Usina Petribú, não existe energia elétrica. Mas
sobra resiliência.
Dona Francisca e seu marido, Severino José, 60, sabem que
ter acesso à energia é um direito fundamental garantido pela Constituição.
Durante meses, juntaram R$ 1,2 mil, com ajuda do décimo terceiro salário, para
comprar lâmpadas e materiais necessários para a realização da instalação
elétrica. Isso porque receberam a boa notícia que, finalmente, a Companhia
Energética de Pernambuco (Celpe) iria à propriedade realizar as instalações
necessárias, após inúmeros pedidos.
O casal sonhou com aquele dia, que ocorreu no dia 9 de
setembro de 2017. Nos planos, Francisca tinha uma geladeira e a reforma do
banheiro da casa para poder receber as visitas. Mas não tardou em se tornar um
pesadelo. Segundo o relatos da senhora, a usina recebeu os funcionários da
Celpe com homens armados e não permitiram a instalação. O desgosto foi tão
grande que Seu Severino sofreu um infarto no mesmo dia – o que só piorou a
situação. Hoje, acamado, vive sob os cuidados integrais da esposa.
A Usina Petribú, por outro lado, alega que a família
entrou na Justiça com um pedido de usucapião e perdeu a causa há cerca de 20
anos. Sem a aprovação da medida que possibilita a aquisição da propriedade pelo
tempo estendido de uso, a terra de dois hectares que Francisca herdou do pai
não é mais sua. Faz parte dos mais de 22 mil hectares da usina. Segundo o
advogado da Usina Petribú, Luis Guerra, os técnicos da Celpe foram proibidos de
fazer a instalação porque a empresa se negou a arcar com os custos.
“Como se trata de uma área afastada, precisaria colocar
muitos postes até chegar à casa dela. Um poste custa, em média, R$ 1 mil.
Ou seja, além de inviável, não é de interesse da usina energizar aquele local”,
comunicou o advogado Guerra. Ele garantiu, ainda, que a usina está promovendo a
reintegração de posse do terreno este ano. No entanto, diz se preocupar com a
vida e bem-estar dos moradores. Por isso, estariam estudando meios de
realocá-los.
De acordo a família, essa harmonia, no entanto, é
desconhecida, uma vez que alegam ter sido vítimas de intimidações, perseguições
e ameaças de expulsão, além de destruições de suas lavouras e o convívio com
queimadas de cana nas proximidades da casa. Apesar de toda suposta violência
sofrida, a família assegura que não desistirá do direito pelo teto e energia.
A assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
comunicou que já está em diálogo com os responsáveis pela Petribú. O intuito,
segundo o comunicado da pastoral, é que as devidas providências sejam tomadas.
O advogado da usina, porém, afirma desconhecer a conversa e que, inclusive,
espera poder negociar com os representantes da família a fim de buscar meios
pacíficos para a saída da família. Fonte: Diário de Pernambuco